Atualmente, uma paisagem de rios preservada do período antes da Antártida estar coberta de gelo persiste a mais de uma milha abaixo da Camada de Gelo da Antártida Oriental.
Um sistema de rios e cordilheiras antigos da era em que o fundo do mundo estava livre de gelo está enterrado a mais de uma milha de profundidade abaixo da Camada de Gelo da Antártida Oriental.
Esta paisagem, localizada na região de Wilkes Land, na Antártica Oriental, na fronteira com o Oceano Índico, cobre uma área aproximadamente do tamanho da Bélgica.
Esse sistema consiste em dois fiordes profundamente entalhados. Além disso, uma série de cursos de água que são completamente invisíveis da superfície, exceto por algumas sutis mudanças de elevação detectáveis por satélite.
Pesquisadores já descobriram outros pontos de referência sob a Camada de Gelo da Antártida Oriental, incluindo um lago de 42 quilômetros de comprimento e montanhas subterrâneas.
A paisagem do rio congelado pode ter pelo menos 34 milhões de anos. Isso significa que ela data do período anterior à Antártida estar coberta de gelo.
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Nesse momento, o dióxido de carbono atmosférico diminuiu, e o clima começou a esfriar.
Com base na topografia da paisagem, geleiras se estenderam e esculpiram os vales dos rios, alargando-os ligeiramente, diz o coautor do estudo, Stewart Jamieson, professor de geografia da Universidade de Durham, na Inglaterra. Em seguida, o clima ficou mais frio, e o gelo submergiu toda a região.
“É como colocar essa paisagem em um freezer”, diz Jamieson.
A preservação imaculada da paisagem é uma pista de que essas mudanças climáticas aconteceram rapidamente, diz Robert Larter, um geofísico marinho da British Antarctic Survey, que não esteve envolvido no estudo, mas revisou a pesquisa para publicação na revista Nature Communications.
O gelo com uma base “úmida” que passa por frequentes congelamentos e descongelamentos, como os das geleiras modernas dos Alpes, tende a erodir as paisagens. As camadas de gelo com bases “secas” que não passam por descongelamentos, por outro lado, preservam as paisagens intactas.
O sistema de rios sob o gelo ainda está nítido e não erodido. “Isso indica que realmente foi algo rápido”, diz Larter. “Não tivemos centenas de milhares ou milhões de anos desse estado intermediário em que o gelo de base úmida fluía.”
A paisagem recém-descoberta está próxima da borda da Camada de Gelo da Antártida Oriental, em uma região chamada Terra de Wilkes. Jamieson e seus colegas notaram algo estranho nos dados da Missão de Constelação RADARSAT, um trio de satélites lançados pela Agência Espacial Canadense.
Esses satélites enviam sinais de micro-ondas que atingem a superfície da Terra. As propriedades dos sinais refletidos de volta para os satélites podem mostrar variações mínimas na topografia do planeta.
Mesmo paisagens muito profundamente enterradas podem afetar sutilmente a superfície da camada de gelo.
Neste caso, algumas áreas irregulares, que eram muito sutis para serem percebidas do nível do solo, sugeriam algo interessante abaixo. Segundo o coautor do estudo, Shuai Yan, pesquisador pós-doutorado em geofísica na Universidade do Texas em Austin.
Essas diferenças não seriam aparentes se você estivesse de pé na superfície do gelo, diz Jamieson, mas elas “saltaram” nos dados do satélite. Para confirmar a presença da paisagem, os pesquisadores usaram dados do Projeto de Exploração Colaborativa Internacional da Criosfera por Perfilamento Aéreo (ICECAP). O qual utiliza instrumentos de radar penetrante de gelo montados em aeronaves para mapear a topografia subglacial.
Paisagem de rios e montanhas
O mapeamento revelou três blocos separados de uma região montanhosa, cada um com cerca de 7.000 a 10.000 quilômetros quadrados de tamanho. O que no extremo superior é ligeiramente menor que o estado de Connecticut. Os blocos são separados por dois fiordes com até 40 quilômetros de largura. Os fiordes mergulham a 1.480 metros e 620 metros, respectivamente, abaixo do nível médio do mar global. A tectônica separou os blocos ao longo dos milênios. Mas é possível traçar caminhos de riachos por toda a paisagem e “ligar os pontos” para ver como os blocos se uniam, diz Jamieson.
A paisagem está em uma região onde o gelo avançou e recuou, diz Jamieson, então é possível que a região montanhosa tenha surgido durante um período sem gelo, tão recentemente como 14 milhões de anos atrás. Porém, confirmar a idade exigiria perfurar 1,9 quilômetros de gelo com uma sonda para obter uma amostra de sedimento abaixo, algo que pode acontecer no futuro, diz ele.
“Se pudermos obter algum sedimento dessa área, há uma chance de que ele possa conter algum pólen fóssil que nos dirá algo sobre a vegetação que costumava crescer nessa paisagem”, diz Jamieson.
Descobrir quando a paisagem foi exposta pela última vez pode ajudar a revelar o quanto a camada de gelo expandiu e recuou em resposta aos climas passados, diz Jamieson, o que pode ajudar a melhorar os modelos de como o gelo se comportará no futuro.
“Houve alguns períodos quentes na Antártida em que sabemos que tivemos alguma perda de gelo”, diz ele, “mas há grandes questões sobre onde e quanto.”