A administração da cloroquina para tratar a covid-19 resultou em quase 17 mil mortes nos países desenvolvidos durante a primeira onda da pandemia em 2020.
Estes dados são informações da revista científica Biomedicine & Pharmacotherapy e estarão disponíveis na edição prevista para publicação em fevereiro.
A pesquisa, conduzida pelas universidades de Lyon, na França, e Quebec, no Canadá, analisou os registros hospitalares de seis nações, onde pacientes foram expostos ao medicamento. O estudo revelou um aumento significativo no risco de mortalidade, principalmente devido a problemas cardíacos.
Embora originalmente destinada ao tratamento da malária, a cloroquina foi inicialmente administrada a pacientes com covid-19. ‘Apesar da falta de evidências documentadas sobre seus benefícios clínicos’.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), após uma extensa investigação, alertou para a ausência de provas sobre qualquer benefício do medicamento para pacientes com covid-19. Enquanto especialistas ressaltaram os possíveis efeitos colaterais do tratamento. Consequentemente, muitos países, removeram a cloroquina dos protocolos de combate à covid-19.
No entanto, no governo de Jair Bolsonaro, houve um aumento no fornecimento do medicamento. O próprio ex-presidente promoveu a cloroquina e anunciou que estava tomando-a.
‘Use logo, pô’, disse Bolsonaro. ‘Você sabe quando esse remédio começou a ser produzido no Brasil? Ele começou a ser usado no Brasil quando eu nasci, em 1955. Se administrado corretamente, não tem efeito colateral’, afirmou o presidente, sem base científica.
No decorrer do primeiro ano da pandemia, Bolsonaro defendeu o remédio em 23 discursos. Em 13 de agosto de 2020, por exemplo, ele afirmou: ‘Eu sou a prova viva de que funcionou’.
Já em 29 de agosto de 2020, em Caldas Novas (GO), ele insistiu: ‘A hidroxicloroquina tem salvo milhares e milhares de vidas no Brasil’. E em seguida, em outubro do mesmo ano, Bolsonaro ainda afirmou que ‘Deus foi tão abençoado que nos deu até a hidroxicloroquina’.
Nos Estados Unidos, o então presidente Donald Trump chegou a sugerir o uso do medicamento. ‘O que você tem a perder? Tome-o’, disse.
A pesquisa recente analisou dados de França, Bélgica, Itália, Espanha, Estados Unidos e Turquia, apontando que cerca de 16,9 mil pessoas podem ter falecido devido ao tratamento com cloroquina.
Os pesquisadores mencionam que o estudo começou com informações divulgadas na revista Nature em 2021, mostrando um aumento de 11% na taxa de mortalidade entre pacientes com a prescrição de cloroquina.
No entanto, os autores do estudo alertam que esses números representam apenas o começo e que é necessário investigar mais a fundo para entender o real impacto. Afinal, houve distribuição do medicamento em vários países nos primeiros meses da pandemia, especialmente sendo promovido por setores da extrema direita no Brasil e nos EUA.
Eles salientam que esses números provavelmente são apenas a ponta do iceberg, subestimando significativamente o número real de mortes relacionadas à hidroxicloroquina em todo o mundo.
O estudo menciona a prescrição off-label, destacando que pode-se considerá-la quando há evidências suficientes para sugerir o benefício do medicamento. No entanto, a primeira série de estudos sobre a HCQ mostrou eficácia limitada ou nenhuma na redução da mortalidade.
Os pesquisadores apontam que a toxicidade da HCQ em pacientes com covid-19 se deve em parte aos efeitos colaterais cardíacos, incluindo distúrbios de condução, contribuindo para metade do aumento na mortalidade por todas as causas, sugerindo que as mortes relacionadas à HCQ também envolvem causas não cardíacas.
Eles também citam um estudo realizado no Brasil que observou um aumento nos efeitos colaterais hepáticos e cardíacos, principalmente doenças cardíacas, entre pacientes hospitalizados com covid-19 leve a moderada, que receberam hidroxicloroquina sozinha ou com azitromicina, sem melhora clínica em 15 dias em comparação com o tratamento padrão.
Em conclusão, o estudo estima que cerca de 16.990 mortes estejam relacionadas à hidroxicloroquina. Embora ressaltem que esse número provavelmente está subestimado pela falta de dados da maioria dos países.
Eles enfatizam as limitações de extrapolar o efeito do tratamento de condições crônicas para condições graves sem dados precisos.
Fonte: Portal de notícias UOL