Quem não viveu na década de 1980 ou era criança naquela época pode não entender os sérios problemas que o Brasil enfrentou nos últimos anos do regime militar.
A situação econômica era difícil, impulsionada por crises globais como a crise do petróleo e o declínio do “milagre brasileiro” nos anos 1970, resultando em aumento da dívida externa.
Havia inflação alta, desemprego elevado e precárias condições de vida, com falta de um modelo eficaz de saúde.
Nesse contexto, surgiu o movimento da Reforma Sanitária, buscando melhorias não só na saúde, mas na qualidade de vida em geral.
O nascimento da Reforma Sanitária e do SUS
Assim, a Reforma Sanitária nasceu durante a luta contra a ditadura, propondo uma visão ampla de saúde.
O Programa Radis, iniciado em julho de 1982, acompanhou o desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS), que foi estabelecido na Constituição de 1988.
Esse caminho foi marcado por desafios até que a saúde fosse reconhecida como direito universal.
O Radis, criado por Sergio Goes de Paula, inicialmente visava fornecer informações de saúde a profissionais e alunos da Escola Nacional de Saúde Pública.
No entanto, à medida que crescia a mobilização pelo direito à saúde, o projeto expandiu seu público para alcançar pessoas que não tinham acesso a informações sobre o tema.
O programa então lançou diversas publicações, incluindo a revista Radis em 2002.
No início dos anos 1980, surgiram os primeiros casos de AIDS e a Fiocruz introduziu a vacina nacional contra o sarampo. O Radis reportou o sucesso da campanha de vacinação contra a poliomielite.
E ali, debateram-se questões como a municipalização da saúde, visando descentralizar o sistema para abranger regiões menores.
O cenário econômico influenciou a saúde
Antes do SUS, a assistência era voltada mais para recuperação do que prevenção. Trabalhadores formais tinham acesso ao Inamps, enquanto a maioria não tinha garantias. A pobreza nas cidades resultava em endemias, e a crise também afetou a campanha de saneamento básico.
Nesse sentido, a 8ª Conferência Nacional de Saúde em 1986 foi fundamental para as discussões que moldaram o SUS durante a Assembleia Constituinte.
E o Programa Radis desempenhou um papel vital na disseminação desses debates. Assim, com o surgimento do Jornal Proposta em 1987 acompanhou a implantação do SUDS, um sistema precursor do SUS.
A questão da doação e compra de sangue
Os bancos de sangue públicos não pagavam nada ao doador.
Mas, antes do SUS, era possível comercializar o sangue, o que reforçava um entendimento da saúde como “mercadoria” e não como “direito”.
Não havia uma regulação específica nem controle de qualidade na transfusão de sangue, o que passou a ser alvo de discussões após o aparecimento dos casos de HIV.
Pois antes de 1988, a prática de venda de sangue não só era autorizada, como também era a principal maneira de se obter sangue no Brasil: 70% dos estoques consistiam em sangue comprado.
Desse modo, o alto número de infecções pelo HIV – no Rio, 80% das pessoas com hemofilia contraíram o vírus após transfusões com sangue vendido – levou a discussão sobre a questão da comercialização do sangue e da qualidade do sangue, especialmente após o aumento dos casos de AIDS.
Muitas pessoas morreram por causa da transfusão, onde recebiam sangue infectado com o vírus HIV. Foi o caso de três irmãos famosos, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, o cartunista Henfil e o músico Chico Mário.
Eles sofriam de hemofilia, doença que necessita de transfusão para o tratamento e foram infectados com Aids, falecendo pela doença.
Além disso, naquele momento a questão da dengue também já preocupava.
Por fim, a criação do SUS trouxe a necessidade de financiamento para sua implementação, marcando os desafios para a nova década.
Fonte: Radis Fio Cruz